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Goiânia, 29/05/24
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Fotos: Reprodução do livro

Foto da capa do livro e foto de Ivan em entrevista com Henrique Santillo no dia da posse de governador, acompanhado de seu gravador "made in Manaus", como ele mesmo brinca no livro

Ivan Mendonça: a vocação, os bastidores e o texto preciso

01/07/2019, às 00:01 · Por Eduardo Horacio

Hoje, segunda-feira, 1º, às 19 horas, na Assembleia Legislativa, será lançado o livro que melhor conta a história de Goiás dos últimos 40 anos. Em uma autobiografia que mistura fatos pessoais e políticos de Goiás, o jornalista Ivan Mendonça põe nas livrarias “O Espião do Morro: Releitura das Mutações do Jornalismo e do Poder Político em Goiás” (Editora Kelps, 295 páginas). O título é um trocadilho ao Morro do Espia, em Tiros (MG), onde nasceu, e também uma boa metáfora de alguém que está sempre em local estratégico, bem posicionado, para ‘espiar’ o que acontecia na política, como bom goiano-mineiro, ou mineiro-goiano.

Para quem gosta de bastidores da política, o livro é um banquete. A começar da briga interna na ditadura militar para escolher o governador sucessor de Irapuan Costa Júnior. O nome de José de Assis acabou sendo derrubado depois que o jornalista Jackson Abrão deu um furo na TV Anhanguera e o “incendiário” Brasílio Caiado reagiu em Brasília, numa articulação que culminou na escolha de Ary Valadão, cabendo a Golbery do Couto e Silva a palavra final sobre quem seria o governador goiano.

Em 1980, Ivan relata ali detalhes do nascimento do Diário da Manhã e uma redação repleta de jornalistas de primeira. Entre outros furos, o de que Iris Rezende havia convidado e Irapuan havia aceitado se filiar ao MDB, dois anos antes da histórica eleição de governador de 1982. Ivan também nota ali o erro político do então senador Henrique Santillo de deixar o MDB para se filiar ao PT. Quando retorna ao MDB, em abril de 1981, a candidatura de Iris Rezende a governador já estava mais que consolidada dentro do partido.

Em 1982, Ivan mostra como a eleição de Iris governador era considerada uma “barbada” por todos, mesmo em um período em que pesquisas eleitorais não dominavam o noticiário. Ao fim, como previsto, Iris se elegeu com dois terços dos votos, em uma votação até hoje não repetida. O livro narra também bastidores de dois comícios das Diretas-Já em 1983 em Goiânia.

Na Folha
Em 1986 e 1987, Ivan assinou uma coluna de opinião na página 2 da Folha de S.Paulo, até hoje a página mais lida do veículo, sempre com notícias de Goiás. A coluna chamava “Brasil Central”. Em 9 de junho de 1987, sua coluna na Folha termina com uma frase que diz muito sobre obras inacabadas: “Goiás está almoçando, jantando e sonhando com a ferrovia Norte-Sul. Pode ser que a obra decrete a falência pública do governo José Sarney, mas certamente o Estado será o último a saber”. Passados 32 anos, governadores e presidente da república ainda falam na mesma ferrovia.

O livro também narra detalhes de bastidores das eleições de Iris Rezende e Maguito Vilela em 1990 e 1994, respectivamente, incluindo o motivo do rompimento entre Lúcia Vânia e Ronaldo Caiado em 1994, que inviabilizou um apoio de Caiado a Lúcia no segundo turno – os dois acabaram perdendo a eleição para Maguito.

Outra parte interessante são os bastidores do nascimento da candidatura de oposição a Iris Rezende em 1998. A escolha inicial por Roberto Balestra mostrou-se errada, tanto que o candidato foi abandonado à própria sorte. Guiado por pesquisas, o então deputado federal Marconi Perillo já sonhava com a candidatura, mesmo com o então presidente Fernando Henrique Cardoso manifestando interesse que o PSDB não lançasse candidato em Goiás e apoiasse Iris.

Ivan conta que no dia 29 de junho de 1998, antevéspera do prazo final para lançamento de candidaturas, foi jantar no apartamento de Marconi na rua 3, no Setor Oeste. Naquele dia, quase todos presentes ao jantar tinham a mesma opinião. Segundo o livro, havia “uma panela de pressão, ligada a todo vapor” para que Marconi desistisse da “aventura” de ser candidato. Entre os que estavam contra a candidatura havia desde Valéria Perillo até o padre César Garcia. Dois dias depois, Marconi, contrariando familiares e aliados, anunciaria a candidatura a governador. Quatro meses depois, seria eleito.

Marconi x Caiado
O início do mandato de Marconi Perillo seria também o começo do rompimento com Ronaldo Caiado, com o ápice se dando em 2003, inclusive com um recado de Caiado para Marconi, via Tião Caroço: “diga ao governador que estou pronto para enfrentá-lo do jeito que ele quiser”. Marconi usou a força da máquina e comandou uma desfiliação em massa de prefeitos do então PFL (hoje DEM) de Caiado rumo ao PSDB. Em 2006, Caiado lançaria a candidatura solo de Demóstenes a governador e, em 2010, a contragosto, aceitaria que o DEM integrasse a chapa de Marconi Perillo, para só romper formalmente em 2014, com o DEM se aliando ao MDB de Iris Rezende.

Antes disso, em 2003, Ivan Mendonça relata um convite que recebeu de Alcides Rodrigues (vice-governador que seria eleito governador três anos depois): ser secretário de comunicação de Anápolis no período em que Alcides fosse interventor. Alcides foi bastante insistente e Ivan teve que recorrer a amigos para declinar do convite. Em 2018, usando metáforas médicas, Ivan diz que um “mal súbito” acometeu o PSDB e o fim do chamado “Tempo Novo” viria com uma cirurgia sem anestesia.

Concisão
Ivan inicia sua carreira no jornal Cinco de Março, primeiro como diagramador e, depois, como repórter, no início assinando “Ivan Mendonça de Lima”. Só em 1978, abandonaria o Lima em nome da concisão, por sugestão do seu editor no Jornal Opção, José Luiz Bittencourt. Sua primeira reportagem sem o “Lima” foi um perfil do então desconhecido Joaquim Roriz, de Luziânia, amigo de Henrique Santillo, que depois viria a ser prefeito de Goiânia e quatro vezes governador do Distrito Federal.

Concisão é uma marca do estilo Ivan Mendonça de jornalismo. O colunismo de notas é diferente antes e depois dele. Ivan já brilhava nas notas quando substituía Arthur Rezende no Magazine, mas foi de 1996 até 2003, como titular da coluna Giro, que algo diferente aconteceu. Com Ivan, a coluna passou a ter personalidade, sem palavras fora de lugar, com o bom-humor permeando as notas como cadências harmônicas. Com Ivan, o Giro passou a ser a primeira leitura de todos que folheavam O Popular, diariamente. Por ali, dada a concisão e a boa apuração, havia informação diária de qualidade para, pelo menos, 10 matérias diferentes.

Vocação
Ivan fala no livro de vários fatos de sua infância, incluindo uma caxumba aos cinco anos, até chegar à adolescência nos anos 70 e a dúvida entre os cursos de agronomia e jornalismo. “Na dúvida, venceu vocação”, registra. Nessa época, como monitor na UFG, Ivan compartilhou com os colegas sua experiência anterior de fotógrafo. Entre outros, foi contemporâneo da então estudante de jornalismo Olga Curado, hoje famosa consultora de marketing que mistura comunicação com aikido.  

O livro tem bons conselhos a jornalistas recém-formados. Conselhos ainda úteis para veteranos que se perdem na vaidade. “Trem se espera na estação, sem sangria desatada. O nome de alguém não pode ser osso para andar na boca de cachorro”, escreve Ivan ao contar do convite que teve para ser editor de fotografia – convite desfeito no mesmo dia.  

Na última página, uma frase que todo político deveria gravar em sua memória: “Igual tempo e poder, políticos também passam, mas o jornalismo permanece”.

Serviço
Lançamento do livro “O Espião do Morro”, de Ivan Mendonça
Local: Salão Nobre da Assembleia Legislativa de Goiás
Dia: Hoje, 1º de julho de 2019
Horário: 19 horas

*Texto publicado originalmente no jornal O Hoje de 1º dejulho de 2019 (link)


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