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Tomara que a produção da Netflix faça com que a gente pare de fingir que o césio não é uma tatuagem na alma de todo goianiense
Coluna do Pablo Kossa: Precisamos da Netfilx para salvar a história de Goiânia?
28/05/2025, às 14:11 · Por Pablo Kossa
Goiânia trata muito mal sua história. Para uma cidade jovem que completará 100 anos em 2033, é impressionante o quanto espaços simbólicos, patrimônios materiais e imateriais, personagens icônicos são negligenciados e esquecidos.
Veja nossa arquitetura art déco demolida ou atrás de
horrendas fachadas. Ou o que deixamos fazer com o histórico Estádio Olímpico. O
descaso com o Jóquei Clube abandonado cuja degradação não promove nada além de
muxoxos nas redes sociais. Se nem com itens dignos de orgulho goianiense temos
zelos, não seria com as chagas que agiríamos diferente.
Um exemplo é a tragédia do Césio-137.
A notícia de que a Netflix prepara uma minissérie sobre o
acidente radiológico de 1987 traz de novo à pauta algo que jamais poderia ser esquecido. Torço para que a
obra audiovisual reverta o descaso de Goiânia com seu passado em relação ao césio.
‘Emergência Radioativa’ será o nome da minissérie.
Trata-se de uma ficção de Gustavo Lipsztein com direção de Fernando Coimbra que
terá foco no trabalho de físicos e médicos tentando salvar vidas diante do
maior acidente radiológico do planeta fora de uma usina nuclear. O mundo
precisa saber mais sobre o que nem mesmo o goianiense sabe muito.
Passei recentemente na Rua 26-A no Setor Aeroporto onde era
a casa e ferro-velho de Devair Alves Ferreira, pai de Leide das Neves. É só um
espaço concretado com uns grafites no fundo. Nenhuma placa, nenhuma referência,
nada que simbolize que aquele terreno foi palco de algo que marca profundamente
Goiânia.
O mesmo acontece no lote da Rua 57 no Setor Central, no
Bairro Popular. Ali era a casa do catador Roberto dos Santos Alves, um dos que
encontrou a cápsula no terreno onde hoje está o Centro de Convenções.
Referência alguma no lote ao fundo do Mercado da 74, nada de uma placa ou
lembrança no quarteirão do cruzamento das avenidas Tocantins e Paranaíba.
As toneladas de material concretado no aterro de Abadia de
Goiás são também negligenciadas e pouco citadas como parte indelével de nosso
passado.
Agimos como se, não mencionando aquilo que aconteceu, o que
aconteceu não mais existisse.
Tomara que a produção da Netflix faça com que a gente pare
de fingir que o césio não é uma tatuagem na alma de todo goianiense.
Esquecer o passado é a forma mais rápida de repetir todos os
erros. Goiânia se esforça muito para errar tudo de novo. Que a minissérie da
Netflix não deixe que a conveniente amnésia siga se impondo.
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