Poder Goiás
Goiânia, 29/05/24
Matérias
Reprodução

Glauber é professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás e pós-doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Glauber Lopes Xavier: o ovo da serpente

10/01/2023, às 21:00 · Por Glauber Lopes Xavier

As imagens e vídeos que circularam pelas redes sociais no último domingo, reportando aos atos de vandalismo praticados pelos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, deixaram muitos brasileiros estarrecidos.

 Entrementes, analistas políticos, jornalistas, profissionais liberais e a própria população se questionava o que teria acontecido para que uma horda de criminosos, auto-intitulados de patriotas, perpetrassem uma verdadeira barbárie, conspurcando as casas que abrigam os três poderes e aviltando os símbolos representativos do chamado Estado Democrático de Direito.

É curioso observar que daquela horda faziam parte homens e mulheres oriundos das camadas médias, mas também, e esta era a sua principal parcela, pessoas de origem humilde, inebriadas pelo fanatismo religioso, manipuladas por uma ideologia fascista escamoteada, contudo, pelo suposto espírito do nacionalismo.

 É possível ver nas imagens e nos vídeos pessoas com a arcada dentária incompleta, os chamados “banguelas”, bem como rostos sacrificados por uma vida de parcos recursos materiais. Não há como não evocar o 18 Brumário de Bonaparte, magistralmente estudado pelo pensador revolucionário Karl Marx.

 Setores das elites nacionais, do agronegócio, do comércio, do extrativismo de toda sorte de commodities, num complô com parte dos militares, manipularam frações da classe trabalhadora e do lumpemproletariado para uma ofensiva que tinha como objetivo suplantar não um regime revolucionário e emancipatório, mas um modelo de governo também burguês, a despeito da preocupação com a redução das desigualdades sociais.

É preciso deixar bem claro: os governos do PT nunca foram revolucionários, no máximo se aproximaram de uma social democracia marcadamente preocupada com a redução das injustiças sociais. Mas também nunca compactuaram com estratégias golpistas, pelo contrário, alcançaram o poder após sucessivas derrotas.

Então o que explicaria uma ofensiva golpista senão a sanha por parte de uma parcela da burguesia nacional pela obtenção de superlucros ou lucros extraordinários exatamente num estágio da dinâmica de acumulação de capital e de organização mundial das forças políticas em que algumas conquistas civilizatórias se fazem defendidas, tais como a defesa do meio ambiente e das liberdades democráticas.

O ovo da serpente que germinou o golpismo teve lugar privilegiado nos desfiles do último 7 de setembro. Ali estava límpida a mensagem de que não haveria espaço para diálogo e que o resultado das urnas, em caso de derrota, não seria reconhecido. Naquele momento Bolsonaro deveria ter sido preso. O ovo da serpente não é tão jovem.

 Para além do golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff, remete à um processo de anistia que deu liberdade aos militares criminosos, assassinos e torturadores da ditadura militar. A ruptura com as bases da democracia liberal burguesa, o golpismo, o fascismo, a barbárie político-institucional nunca foram estados de excepcionalidade no Brasil, mas a regra.

A contingência, o arremedo burguês-rural, a indústria capenga e a finança mundializada, tem sido a regularidade desde o pós-redemocratização, a despeito dos esforços em torno da criação e consolidação de sistemas públicos e universais de saúde e de educação, de programas públicos de moradia e da promoção de uma renda mínima aos mais pobres, fundamentais inclusive para o funcionamento harmônico de qualquer sociedade edificada sob os valores burgueses.

Quem é Glauber Lopes Xavier:

Obteve doutorado em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás e pós-doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Professor efetivo da Universidade Estadual de Goiás, atuando na graduação e na pós-graduação. Desenvolve pesquisas em Economia Política, principalmente sobre as seguintes temáticas: capitalismo, teoria marxista, Estado, América-Latina.


Glauber Lopes Xavier Opinião Artigo
P U B L I C I D A D E