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Goiânia, 29/05/24
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Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Quase todo discurso de Caiado tem o tom ético, moral, anti-corrupção servindo de base para o resto, sempre com críticas às gestões passadas e velados autoelogios

Riscos e desafios do discurso de moral e ética de Ronaldo Caiado

09/08/2019, às 00:43 · Por Eduardo Horacio

O governador Ronaldo Caiado (DEM) demonstra fixação por temas como honestidade, moral e ética desde que iniciou na vida pública. Essa agenda saiu de seu discurso parlamentar, atravessou fronteiras e desembarcou no Palácio das Esmeraldas. Em um Estado muito abalado pela conduta temerária do antecessor, o democrata surfa na onda e não perde a chance de tentar demonstrar que é diferente em cada gesto, em cada ação.

Ao trazer um cientista político a Goiás (Clóvis Barros) para palestrar a milhares de servidores exatamente sobre ética no serviço público, o governador Ronaldo Caiado só reforça a prioridade que essas pautas têm em seu governo. A ênfase a qualquer custo no estrangeirismo "compliance", que nem 5% dos goianos devem saber o que significa e mesmo assim virou "programa de governo", revela até um fetiche exagerado pelo assunto. 

Quase todo discurso de Caiado tem o tom ético, moral, anti-corrupção servindo de base para o resto, sempre com críticas às gestões passadas e velados (às vezes, nem tanto assim) autoelogios. O moralismo está em discursos como "a corrupção é que estraga o asfalto e não a chuva", no ataque ao ex-governador Marconi Perillo (PSDB) ao dizer que espera que "dinheiro de bens bloqueados de Marconi 'voltem' ao Estado para ele pagar a folha" ou em ações como a venda de carros de luxo para doar ao Hospital Materno Infantil. 

A um servidor público, qualquer que seja a função, é exigido um conjunto de condutas que visam transparência, zelo pela coisa pública e o melhor atendimento à população – para isso os governos são eleitos. Essas são condições inegociáveis, mas que devem efetivamente pertencer e não ser parte da retórica de um gestor.

Dessa forma, virtudes como honestidade, ética e moral tanto na condução de uma gestão como em sua vida particular são condições naturais. Mas certamente esses atributos não estarão presentes nos discursos, nem serão metas prioritárias de uma administração.

É necessário um parêntese para apontar que existem regras de conduta, cursos e formulações que visam qualificar serviços e servidores e evitar equívocos pontuais ou erros que causem prejuízo ao erário. Elas pertencem ao cotidiano de um governo, mas ocorrerem de forma natural e não como imposição, ambição ou meta principal.

E por que não é inteligente a um governo, conservador ou progressista, ter essas pautas como agenda prioritária? Simples. Primeiro, o eleitor que confiou o voto espera que essas sejam condutas corriqueiras. Assim, o que se espera de fato é que o governo seja efetivo, que atenda as demandas da população.

Além disso, qualquer governo, por melhor e mais correto que seja o governante de plantão, é passível de escândalos em que ética e moral sejam questionadas. Quando essa agenda não é a principal, o gestor poderá se livrar de qualquer situação de embaraço de forma mais assertiva. Do contrário, o constrangimento e os prejuízos serão maiores.

Por último, mas importante, em muitos casos a imposição de uma agenda moralista em demasia ou que cobre ética do café da manhã ao jantar, pode esconder uma conduta oposta. Não parece ser o caso de Caiado, mas já foi o caso de muitos. 

Muitos exemplos

Ética e moral eram as pautas prioritárias, por exemplo, do então senador Demóstenes Torres, que de 2001 a 2012 foi colega de partido de Caiado. No auge, Demóstenes apontou ‘dedo na cara’ de colegas no Congresso. Ao ser pego em uma amizade profícua com o contraventor Carlinhos Cachoeira, o discurso do senador desmoronou e sua promissora carreira política derreteu como um picolé em Cuiabá. 

Essas também são pautas caras ao presidente Jair Bolsonaro (PSL). Porém, exceto para a claque que o acompanha em qualquer situação, o presidente tem grande dificuldade em defender situações como a forma com que um dos filhos distribuiu cargos e salários na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Ou a razão pela qual indicou outro filho para ocupar a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, mesmo sem qualificação para tal.

Vale ressaltar que é salutar a preocupação de Ronaldo Caiado, que pela primeira vez ocupa um cargo Executivo. Se capitanear um governo ético e transparente (o que não ocorre até aqui, já que os principais dados do Estado estão inacessíveis no Portal da Transparência e muitas ações e demissões no governo nem explicação oficial têm), Caiado já terá feito um bem a Goiás.

É preciso que o governador Ronaldo Caiado tenha a exata compreensão de que a expectativa e os desafios que pesam sobre os seus ombros são muito maiores. Não há discurso de moral e ética que o livrará de um retumbante fracasso se o seu governo não deslanchar. 


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